Na fila por mil vibradores, vergonha é o maior medo que existe
Antes das 9h, algumas mulheres já esperavam para garantir o vibrador distribuído gratuitamente por sex shop
18 JAN 2024 • POR Redação/EC • 15h00Durante a primeira hora de distribuição gratuita de vibradores pela Afrodite Sex Shop, risos misturados com curiosidade e tensão tomaram conta da loja logo cedo nesta quinta-feira (18). Apesar do desejo pelo brinde e de muitas mulheres bem resolvidas com a própria vida sexual, a vergonha ainda se espalha como o maior medo.
Sem grandes filas do lado de fora, a loja ficou cheia durante todo o tempo em que permanecemos observando a movimentação e conversando com quem entrava e saía. Isso porque metade do público se interessava por outros itens e aproveitava para conhecer os brinquedos sexuais, enquanto a outra metade caprichava na rapidez para apenas retirar o vibrador em formato de golfinho e sair do espaço.
Em quase sua totalidade, o público é feminino, mas alguns poucos homens também foram ao sex shop no modo ‘a jato’. Entravam na loja com aparente vergonha, perguntavam sobre o brinde, recebiam a sacolinha sem identificação e se despediam rapidamente, sem chance de conversar para explicar a pressa.
E, nesse vai e vem, encontramos quem aceitasse dar seus depoimentos sobre a experiência de buscar o brinquedo logo cedo na região central da cidade. Mas, apesar de muitas falas sobre estar bem resolvidas consigo mesmas, ninguém quis se identificar na matéria.
Sem saber como se comportar, a auxiliar de almoxarifado Aline (*), de 47 anos, foi até o sex shop “empurrada” pelas amigas. E, na hora em que chegou à loja, realmente precisou de um empurrãozinho para passar pela porta.
Acompanhada por outras três mulheres, ela fez questão de afirmar que só foi para acompanhar o grupo quando questionei sobre o interesse. Olhando para baixo, sem encarar os pênis de borracha que se espalhavam pela prateleira em sua frente, ela comentou que o “problema” não eram os olhares dos outros, mas os seus.
“Acho que o que pega mais é o meu julgamento mesmo, não sei explicar, é uma vergonha”, relata a trabalhadora. Mesmo assim, depois de passar um tempo na loja ao lado das amigas, Aline garantiu seu vibrador, só saiu com ele debaixo da camiseta, para que ninguém de fora pudesse ver.
A responsável por arrastar Aline, Roberta (*) já é cliente há anos, desde quando decidiu tomar coragem para tentar “salvar o casamento”, em suas palavras. “Eu vi ontem e chamei as meninas para virem comigo. Eu já fui várias vezes, gosto, tenho experiência com os produtos”.
Há cerca de três anos, quando teve a primeira experiência com sex shop, o medo era presente. Já hoje, o receio que sentia lá atrás passou.
“Eu estava em crise no casamento, mas depois continuei indo. O casamento acabou, não teve o que fazer, estou divorciada, mas continuo comprando. Agora é para mim mesmo”, resume Roberta.
E, sobre garantir que a amiga pisasse na loja, ela defende que o tabu precisa ser quebrado aos poucos. Inclusive, fazendo com que as pessoas tenham essa coragem inicial.
Auxiliar de educação, Maria (*), de 34 anos, foi a primeira a chegar na loja, antes mesmo das 9h, o horário de abertura do funcionamento. “Eu tirei print da notícia e mandei para um monte de gente. De todo mundo, só minha sobrinha veio comigo e acho que foi por uma falta de coragem mesmo”, conta sobre como ficou sabendo da distribuição e interesse pela ação.
Cliente de sex shops há anos, ela explica que se encaixa no grupo de mulheres que se sentem tranquilas com a própria vida sexual. Mas, por outro lado, o olhar da família ainda é um problema.
“Eu sempre fui muito tranquila com esse assunto, mas é algo meu porque minha família é bem conservadora, tanto que eles não sabem que eu estou aqui. Quando eu peço algo pela internet, nunca envio para minha casa porque minha mãe ainda fica meio chocada”, diz Maria.
É por esse motivo, o receio do olhar familiar, que ela pede para manter sua identificação anônima. Ainda assim, faz questão de defender que ao menos uma autoaceitação aconteça com as mulheres.
“Acho esse medo uma besteira, a mulher tem que se conhecer. Tem muita mulher que é retraída com o corpo porque não se conhece. Existem produtos bons, extravagantes, mas também tem aqueles simples e que funcionam”, relata a auxiliar de educação.
Com ideias parecidas com a de Maria, Juliana (*), de 33 anos, desabafa que prefere preservar seu nome devido à profissão, não pela família. “A gente lida com público variado e acredito que as pessoas não veem o sex shop com os olhos que deveria ser visto. Deveria ser visto como uma coisa normal porque todo mundo transa”.
Sobre sua relação com os brinquedos sexuais, ela comenta que toda mulher precisa apimentar a relação e os acessórios fazem diferença nesse momento. “As mulheres precisam procurar outros produtos além do vibrador. Acho que não tem que ter essa vergonha consigo mesma, não tem que gerar esse tabu, precisa ser algo normalizado”, diz.
(*) Os nomes são fictícios para preservar a identidade das entrevistadas.
Aletheya Alves/CGNews