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Terra dá o alimento, mas se vinga do homem quando a ganância é desenfreada, afirma filósofo

Por: Mário Pinheiro

26 SET 2021 - 10h:12 Por Redação/TR
Foto: Reprodução / O Jacaré

No artigo ““Sísifo e as borboletas”, o filósofo e jornalista Mário Pinheiro responsabiliza os usurpadores, que se proclamam produtores rurais, pelos efeitos nocivos causados ao meio ambiente e à terra. Na sua avaliação, a ganância desenfreada, sem limites e que tem apenas o dinheiro como limite, é a responsável por grande parte das nossas tragédias.

“Quem trabalha com a terra, acaba por desenvolver o respeito por ela, por tudo que oferece como fruto. Mas o sujeito que planta em quantidade absurda, joga o pior tipo de pesticida para obrigar a terra a dar lucro, este mata seu semelhante para encher a conta bancária, para ter o tapete estendido ao exibir a dentadura de ouro”, ressalta.

“Eles matam, contratam advogados e saem pela tangente. A desigualdade da distribuição da posse da terra no Brasil beira o absurdo. Isso sem contar áreas protegidas invadidas por políticos, empresários, mais a grilagem gratuita”, afirma. “Para se ter uma ideia desta aberração, 2 mil latifúndios ocupam área maior que 4 milhões de propriedades rurais. Mato Grosso é o Estado campeão em propriedades com mais de 10 mil hectares”, destaca.

“A terra compõe a divindade que completa a natureza. Aos panteístas, a Terra é mãe, deusa que oferece os alimentos. Mas quando a avareza é gigantesca, o desrespeito passa dos limites e as máquinas agrícolas usadas na inteligência artificial substituem o homem, desemprega-o e empurra para a morte de câncer lento nas periferias da cidade, a própria Terra um dia se vinga”, afirma.

Confira o artigo na íntegra:

“Sísifo e as borboletas
Mário Pinheiro

A liberdade do pássaro é seu passaporte para voar. Entre estações de flores, chuva, céu fechado, ventania ou luas cheias, eles piruetam, constroem ninhos, cantam e comem o que a terra lhes dá. Está escrito em Mateus “olhem os passarinhos, eles não ceifam, não colhem, não armazenam…”

O sabiá já soube de tudo, os pardais não podem viver em gaiola, quem criou a grade para os bichinhos foi o bichão homem. Entre tantos bichos benéficos que polinizam, como abelha, borboleta, moscas, lagartos, morcegos, há também as aves. Mas a monocultura dos espertões do latifúndio assassina a natureza em nome da maldita produção de massa e do lucro. O veneno, o pesticida, não acaba somente com os polinizadores, mas leva o câncer ao homem que mata suas células no dia a dia.

As borboletas são incontáveis, coloridas, belas, e cumprem um papel importante após a transformação, a metamorfose. De flor em flor a sina se desenha. Ela tem duas fases na vida, antes e depois de virar rainha dos ares, de cores fantásticas.

Agora, o gafanhoto pode até ser um inseto comum, mas ele pode destruir a lavoura de milho, feijão ou trigo se vier em bando. E bando, quando é maligno, destrói tudo, o exemplo é claro na política brasileira, há um bando no Planalto. Eles são piores que gafanhotos. De QI baixíssimo, eles se armam, complotam, juram falso, se aliam aos exemplos podres dos eleitos sem honra, formaram a bancada da bala, a milícia. Enfim, esse bando tirou tudo dos trabalhadores, viraram o nojo em termos de política nacional e internacional. O bando, liderado pela família de ratazana, está levando clandestinamente a madeira da Amazônia, abrindo clareiras no maior desrespeito com a terra.

Quem trabalha com a terra, acaba por desenvolver o respeito por ela, por tudo que oferece como fruto. Mas o sujeito que planta em quantidade absurda, joga o pior tipo de pesticida para obrigar a terra a dar lucro, este mata seu semelhante para encher a conta bancária, para ter o tapete estendido ao exibir a dentadura de ouro. Pior, antes ele inventou a UDR (União Democrática Ruralista) cuja finalidade era se impor pela força, pelo maldito excremento do diabo (o dinheiro), pela arma e pela política de matuto.

A UDR reunia os latifundiários para abraçar a causa do jagunço, do matador de aluguel. Depois, por esperteza ou por serem mal vistos pela opinião pública, virou “agrobusiness”, o agronegócio. Então, de um dia para o outro, estava estampado nos outdoors que viraram celeiro da produção mundial ao amedrontar o Movimento Sem Terra que produz em menor quantidade, mas de forma sã, sem agredir aquela que nutre há séculos o homem. Eles, povinho da UDR, perderam a sintonia com a vida, vale mais o ter, o ser pouco importa. O número de líderes do MST assassinados por todo o Brasil em nome da famigerada produção ou aquisição ilegal da terra, deixa qualquer pessoa racional sem os pés no chão.

E toda a mentira da reforma agrária começa em novembro de 1964 quando os militares enganaram os movimentos sociais de que o conjunto de leis do Estatuto da Terra avançaria o processo e realizaria a distribuição das terras. Desde então, os mandantes montados em seus carros de luxo, revólver na cintura, acompanham os jagunços que destroem plantações, expulsam os habitantes, queimam lavouras e se impõem como grileiros. Hoje eles fazem parte politicamente do “centrão”.

Eles matam, contratam advogados e saem pela tangente. A desigualdade da distribuição da posse da terra no Brasil beira o absurdo. Isso sem contar áreas protegidas invadidas por políticos, empresários, mais a grilagem gratuita. Para se ter uma ideia desta aberração, 2 mil latifúndios ocupam área maior que 4 milhões de propriedades rurais. Mato Grosso é o Estado campeão em propriedades com mais de 10 mil hectares.

O castigo ao ser humaninho que afronta a bondade da mãe terra, é semelhante ao de Sísifo, ele entra na teoria do absurdo. O rico latifundiário comete suicídio involuntário, ele desconhece o segredo e a beleza da borboleta, envenena os rios, fuça a terra com mercúrio a procura de ouro, despeja suas porcarias que o peixe acaba por engolir. O peixe que comeu plástico, linhas de pesca, insetos que morreram pelo veneno do homem, acaba no prato que ele come.

Sísifo, da mitologia grega, aquele que desobedeceu aos deuses, recebeu o castigo do absurdo, segundo Albert Camus. A terra compõe a divindade que completa a natureza. Aos panteístas, a Terra é mãe, deusa que oferece os alimentos. Mas quando a avareza é gigantesca, o desrespeito passa dos limites e as máquinas agrícolas usadas na inteligência artificial substituem o homem, desemprega-o e empurra para a morte de câncer lento nas periferias da cidade, a própria Terra um dia se vinga.

No lugar da vida de Sísifo está a pedra redonda, e, borboletas e abelhas já não polinizam porque a ganância do falso “grande produtor” rural é tamanha que ele desconhece, por ignorância, a utilidade até da minhoca. A terra sempre alimentou a humanidade, as pragas que destroem e invadem não são os bichos, são os usurpadores que se autoproclamaram “produtores rurais”.”

(*) Mário Pinheiro é jornalista pela UFMS, mestre em Sociologia da Comunicação, filósofo e doutor em Ciências Políticas ambos por Dauphine, Paris.

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